segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Histórias de Moniquinha a menina agitadinha

Histórias de Moniquinha a Menina Agitadinha

Naquela antiga fazenda de laranjas que aos poucos ia sendo loteada e mais tarde viraria Vila Valqueire, nasceu Moniquinha.
Foi crescendo alegre, sapeca, levada da breca.
Era muito curiosa, observava as cores, os bichos e as flores.
E em vários porquês agitava por onde passava.
Por que as formigas são pretas e pequeninas?
Por que as borboletas são tão coloridas?
Por que as frutas são tão doces?
Tantos porquês deixavam sua mãe e todos a sua volta tontos.
E mandavam Moniquinha ir brincar.
Quando muito silêncio sua avó dizia à sua mãe, onde está a Moniquinha e logo
ouviam-se os chamados de sua mãe, e ela nunca respondia e quando a encontravam, lá estava Moniquinha dependurada numa árvore, aninhada como passarinho, pensava ter asas, não tinha medo de altura.
Saboreando maduros sapotis, semente plantada pelo vovô querido. Veio de Longe. Sergipe ele disse, amava passarinhos e plantas.
Vovó odiava a sujeirada de alpistes, girassóis e a cantoria. Mas vovô nem ligava, isso lhe dava muita alegria.
Observava seu avô limpar cada gaiola com cuidado, trocar a água, sementes e frutas, mas cortar as unhas era o mais dolorido.
Não machuca eles dizia Moniquinha, ta saindo sangue! E o vovô dizia que era pro bem. Por que machucar é pro bem? Perguntava a menininha, agitadinha ao ver os passarinhos com os dedinhos machucadinhos.
Seu avô dizia que a unha não podia crescer senão os passarinhos não voariam. E lá vinham mais porquês. E por que eles não podem voar fora das gaiolas se havia outros que viviam nas árvores da casa e ninguém cortava-lhe as unhas.
Não entendia como machucar era amor.
E seu avô respondia: - Porque eu amo as aves.
Mas por que precisamos prender quem amamos? As gaiolas são ruins, só da pra voar pouquinho. Eles querem voar mais no altinho.
E seu avô dizia: Eles não sabem viver sozinhos vão morrer de fome.
Por que eles não sabem viver sozinhos? Atordoado com tantas perguntas, seu avô pedia algo para Moniquinha fazer.
_Busca água pro vovô!
Lá ia Moniquinha buscar a baciinha.
Quando chegava já quase não tinha nada. Moniquinha nunca soube andar corria o tempo todo.
Corria o dia inteiro porque não tinha asas. Pois se as tivesse voaria o dia inteiro junto aos passarinhos.
Sua vontade era de abrir todas as gaiolas e soltar todos os bichos. Os pássaros, os porcos, os bois, e as galinhas com seus pintinhos. Mas Moniquinha era muito pequenininha e não alcançava as tramelas.
Tudo que se criava era para alimentação, pois à caça fora proibida!
Antes seus tios viajavam até o centro do país e caçavam por três meses e lá mesmo salgavam as carnes. Caçavam veados, pacas, tatus, tartarugas enquanto os que ficavam pescavam.
Quando retornavam eram divididas as caças e havia carne pro ano todo.
Todo alimento era fruto de muito trabalho.
Quando chegavam da pescaria era aquela euforia, todas as tias e suas bacias e a divisão dos peixes, siris, camarões, cações, baiacus e sardinhas, nem sempre trazia contentamento, não era justo para algumas, queriam mais alimento.
Mas quem não ajudava a puxar a rede não come peixe e muitos tios eram preguiçosos. O mais habilidoso pescador faz rede até hoje. O Tio Jairo, não podia ver nada se mexer que já estava ele com a espingarda. Tiro certo, mira boa e logo farofa de pardal.
_ Tio por que matar passarinhos, são tão pequeninos, só tem penas e coração?
E o tio respondia:_ É muito Baamm!”
Por que devorar corações tão pequeninos? Pensava triste a menina agitadinha.
Logo se ouvia a voz de sua avó Zica:_ Moniquinha vá ver se há postura, vovó queria que Moniquinha trouxesse os ovos das galinhas e a menina dizia,_ não dá vó “elas bilisca”
Sua avó a ensinara a pegar os ovos e todas as manhãs havia comida quentinha.
Ovos quentes, bolos de milho e fubá, leite das vacas, tirados pelos tios, o café já colhido e torrado e seu cheiro suave.
Corriam todos pra mesa, vovô tinha feito uma mesa grande com grandes bancos.
Todos sentavam juntos davam graças e comiam antes da lida.
Mas à hora do almoço era aquele alvoroço. Moniquinha não entendia por que os olhos dos peixes eram tão tristes, por que os siris não queriam ficar na panela, por que as rãs se mexiam mesmo com as cabeças cortadas.
Achava à vovó muito má. Ela cortava os peixes e tirava tudo deles. A tartaruga gritava a água tava quente.
E Moniquinha perguntava: Por que tem que colocar a tartaruga na panela?
Vovó dizia que só assim a casca saia.
Moniquinha ia crescendo e a criação ia diminuindo.
Quando mataram o último porco, ninguém conseguiu comê-lo. Já era da família e o chiqueiro muito limpo. Vovô lavava três vezes por dia para não ter mosca, agora tinha vizinho!
Quando seu avô morreu, encontrou sua tartaruga repleta de formigas devorando seus olhos.
Vovô tava doente, tossia muito. Chamaram o Arlindo pra dar injeção e Moniquinha pediu:_ Deixa eu ver vovô? E o vovô disse: _ Vá brincar e fechou a porta!
Quando abriram a porta, ele já não vivia.
A grande mesa onde se fartavam foi arrumada e colocaram o vovô nela.
E Moniquinha ficava pensando. Por que o vovô ta com a roupa da missa?
Por que ta tão bonito, por que não se mexe?
E a vovó disse baixinho: _ vovô foi pro céu! E correu até o portão e gritou: _ estou livre!
Como vovô foi pro céu, não tinha asas se ela o via ali na mesa?
Vovó conhecera o vovô no dia do casamento, teve nove filhos e vovô a prendia como prendia seus passarinhos.
A primeira coisa que a vovó fez foi chamar o tio João e antes mesmo que o corpo saísse em cortejo até o cemitério, não havia mais nenhuma gaiola na casa. E havia gaiolas em todas as paredes e tetos pela casa, varanda, onde houvesse um prego havia uma gaiola, também tinha mico preto, macaco Tião, e papagaio que cantava:_ fá fá RO fá fá RO f fá RO fá RO fá fá.
Tudo ficou cinza, a parreira não deu mais uva, graviolas e nêsperas agora nasciam pequeninas.
Tudo ia virando areia com cinza, onde era verde agora cimento frio.
Outras ferramentas e outros bichos.
Cães e gatos esses não se comiam mais.
O leite vinha numa garrafa de vidro que o leiteiro deixava no portão pela madrugada se trocava pelo vidro vazio.
O padeiro de bicicleta com sua buzina acordava os vizinhos, aquele cheiro bom de pão quentinho. Doce na cesta da frente e salgado parte de traz. Vovó não assava pães mais.
Gritava: _Trás o dinheiro. Umas moedinhas e um sacão de pão.

Moniquinha continuava crescendo e com ela muitas perguntas.
Queria entender o mundo e perguntava: O que é o mundo pra um pra outro. Até que sua prima lhe disse:_ Preste muita atenção Moniquinha que eu vou te responder. Olha para o céu. E a menina olhava para o céu bem azul e imaginava muitas coisas.
E sua prima lhe disse: _ O mundo é uma bola, dentro de outra bola, que a Baleia engoliu!
E Moniquinha ficou pensando nisso:
O mundo é uma bola, dentro de outra bola que a Baleia engoliu e nunca mais fez perguntas, mas continua agitadinha!


“Nós precisamos de alimento para carne e para o espírito”
Melissa Alba Jardin